segunda-feira, 2 de junho de 2014

Nossa história luso-brasileira: O bacalhau dos "Palma".

Salve salve sossegados!

Essa postagem tem gostinho de tempero de família, daquelas receitas recheadas de histórias que passamos de geração em geração. Na verdade a promessa era domingo, mas por falta de algumas confirmações familiares, acabei deixando para postar somente hoje, na segunda feira! 
Minha ascendência lusitana, inegável nos meus traços físicos, também o é nos hábitos culinários: O gosto pelo azeite de oliva em tudo, a paixão pelos doces cristalizados e de compota e a predileção pelo famoso bacalhau são algumas das confirmações - e das lembranças que trago sempre junto a memória.
Lembro das festas religiosas - especialmente Páscoa e Natal, onde não faltavam muitos doces e é claro muito bacalhau; em especial uma receita praticada desde os meus tataravós, que se assemelha a uma moqueca de peixe assada. 
Para falar do bacalhau, antes é necessário compreender que essa "vedete" da culinária portuguesa, é oriunda de várias espécies de peixe, em provenientes das águas frias do atlântico norte, mais especificamente da Noruega e do Canadá. 
Portugal tornou-se o maior beneficiador deste tipo de alimento devido aos "desbravadores", que se aventuravam mar adentro - afinal o sal é um dos conservantes mais antigos, eficientes e baratos, tornando-se então uma forma viável e eficaz de se prover a fonte de proteínas durante as grandes navegações,  além de elevar o preço do produto na comercialização.  
A espécie de peixe que dá origem ao mais caro - e melhor - bacalhau conhecido como "bacalhau do porto" é o Ghadus Morua. Ao cozinhá-lo, ele se desmancha em lascas uniformes e é mais amarelado, de sabor inigualável. Já encontrei essa iguaria custando cerca de R$ 60,00 / Kg, contra singelos R$ 28,00 /kg do similar mais próximo em sabor e qualidade. 
Com as altas dos preços hoje, há opções "genéricas" de peixes salgados "Made in China", que se aproximam (meio de longe) do sabor do bacalhau "original", mas a textura é totalmente diferente, pois eles desfiam mais e os filés são mais finos. 
Li também algo sobre o bacalhau brasileiro, o pirarucu, originário da Amazônia - que honestamente nunca experimentei, mas se vocês quiserem dar uma "bisolhada" nesses links
 aqui,  e  aqui, das Revistas Superinteressante e da revista Adega, respectivamente, poderão encontrar mais informações! 
Agora chegando ao ponto crítico: o cheiro! Quanto a isso, acredito que seja tudo a mais ou menos a mesma coisa em um primeiro momento: lembra o cheiro de dobradinha e infesta todo o ambiente em que se está cozinhando. 
Portanto, é necessário alguns cuidados, que só fui aprender depois de consultar meus sábios oráculos - entenda-se mãe, tias e vovó, afinal elas são peritas nisso há muito mais tempo que eu! 
Para começar, o ideal é lavar o bacalhau  em água corrente retirando a camada grossa de sal e depois deixá-lo de molho na água por 12 horas, pelo menos, sempre trocando a água a cada 3 horas. Depois de dessalgar, para sair o cheiro forte, é necessário aferventá-lo em uma solução de água, vinagre e bicarbonato de sódio por cerca de 40 minutos, e em seguida aferventar novamente em água limpa. 
Esse pré preparo é indispensável, pois do contrário seu prato pode até ficar saboroso, mas o cheiro não será nada aprazível e vai acabar estragando o paladar de qualquer uma das inúmeras receitas disponíveis na internet e nos livros (sejam elas de ensopado, bolinho, escondidinho, lasanha, moqueca, etc).
Falando em receitas,  uma  das mais famosas e folclóricas é o a do "Bacalhau a Gomes de Sá, o criador do prato típico do norte de Portugal. Apesar da simplicidade, este prato torna-se saboroso e especial devido ao preparo,  que após todo aquele processo de "dessalga" e "aferventamento", a receita propõe que as postas marinem no leite, fazendo com que elas absorvam mais água - devido a gordura do leite - e fiquem tenras. 
Já a receita da família Palma - da qual sou descendente - varia um pouco nos ingredientes mas também é extremamente simples e leva camadas de batatas pré cozidas e sem casca, cebolas em rodelas, tomates em rodelas, pimentões (que com o passar dos anos fomos abandonando o uso) e é claro, o bacalhau desfiado grosseiramente. Por ser uma tradição quase que "verbal", cada um adaptou seus gostos e temperos com o passar do tempo, mas a gênese e sabor de infância permanecem inalterados! 
Este ano, também resolvi variar um pouco trocando o tomate pelo tomate seco, e acrescentar umas folhinhas de manjericão no final, o que conferiu uma sabor bem especial à tradição - preparado a quatro mãos com a aprovação da família! 
Confere lá! 




Bacalhau da Família Palma, reinventado pelo Sossega!


Ingredientes: 

- 700g de bacalhau dessalgado, aferventado e desfiado grosseiramente
- 3 cebolas cortadas em rodelas finas 
- 8 batatas grandes pré cozidas, descascadas e cortadas em rodelas de aproximadamente 0,5cm
- Tomate seco hidratado (aproximadamente 100g) e picado.
- Azeitonas pretas sem caroço a gosto
- Azeite de oliva a gosto
- Sal a gosto
- pimenta branca a gosto
- Folhas de manjericão a gosto.


Preparo: 

- Pré aqueça o forno a 180°
- Regue uma assadeira grande com azeite de oliva e disponha uma camada de batatas. Regue-as com azeite e polvilhe sal a gosto, com cuidado para não exagerar. Em seguida disponha uma camada de cebolas e espalhe o tomate seco picado. Não precisa deixar o tomate seco juntinho pois o que deve sobressair é o sabor do bacalhau, então não precisa carregar no tomate seco. Regue novamente com azeite e sal, disponha o bacalhau e coloque azeitonas. Também não precisa exagerar nas azeitonas para não estragar o sabor. regue com azeite, sal e pimenta branca. Torne a fazer outra camada de batatas, e vá repetindo as camadas deixando a ultima camada de batatas. Coloque algumas azeitonas para decorar, regue com azeite, polvilhe o sal e cubra com uma folha de papel alumínio. 
- Leve ao forno por 20 minutos, depois retire o papel alumínio e deixe por mais 15 minutos no forno, para dourar a batata. 
- Quando retirar do forno, espalhe as folhinhas de manjericão fresco e sirva com um bom vinho de preferência branco ou verde!  


Observações: 

- Descasque as batatas e cozinhe-as no vapor. É mais fácil controlar a textura e a batata fica mais saborosa. Elas devem ficar bem consistentes e não molengas, pois ainda serão levadas ao forno. 
- Hidrate os tomates secos em uma solução de três partes de água e uma de vinho branco e uma pitada de bicarbonato de sódio por 40 minutos. Depois lave-os em água corrente e torne a deixar na água limpa por mais 20 minutos. 
- Se quiser você pode acrescentar queijo parmesão para gratinar, também fica muito gostoso, mas cuide com o sal! 


Então, gostaram? 
Agora é só se arriscar e contar pra gente! 

Abraço grande! 


Em tempo: 
Nesta versão, devido ao alto custo do bacalhau na ocasião, utilizamos o "genérico" da China, o "Polaca do Alaska". O gosto lembra o da minha infância, mas a textura é como disse anteriormente, bem mais "fiapenta". Um contraponto ao preço, que acabou tornando-se muito convincente, tanto que decidimos arriscar levando em conta que nem sempre dispomos de "numerário" para adquirir uma iguaria originalíssima! 
Normalmente o acompanhamento é com arroz branco, mas ali na imagem, como vocês podem notar, utilizei o arroz integral por conta da dieta da família. 

3 comentários:

Unknown disse...

É necessário dessalgar o Polaca do Alasca também, como o bacalhau?

Priscila Dal Bosco disse...

Maricy, tudo bem?
Então, o Polaca do Alasca eu não dessalguei, apenas aferventei com água e bicarbonato de sódio e vinagre. A proporção é mais ou menos assim: para cada quilo de peixe, você deverá cobrir com água até passar 2 dedos do volume. Acrescente uma colher de chá de bicarbonato e uma colher de sopa de vinagre branco. Prefiro sempre o vinagre de maçã ou de vinho branco e nunca uso o de álcool.
Mas nada como o bacalhau mesmo...
Abraço e obrigada por comentar.
Visite o novo endereço: www.sossegofelia.com

Unknown disse...

Muito obrigada pela resposta! Descobri que certa vez eu havia comprado polaca salgada, tipo bacalhau mesmo. E hoje havia polaca não salgada... Aquela que comprei salgada ficou excelente (fiz "à Gomes de Sá", no lugar do bacalhau). Tinha sabor de bacalhau, mas de um jeito mais suave. Um abraço!